domingo, 8 de novembro de 2009

Derrubada do veto do Prefeito a Projeto de Lei aprovado pela Câmara de Vereadores

DO VETO DO PREFEITO A PROJETO DE LEI APROVADO PELA CÂMARA DE VEREADORES.


1. Do Princípio da Legalidade e a Administração Pública.


Um dos principais imperativos e qualificadores do Estado-de-Direito encontra-se consubstanciado no princípio da legalidade. Este princípio, de presença constante e inarredável de qualquer atividade administrativa, impõe a eficácia do ato administrativo à vontade da lei. Em nosso ordenamento jurídico sua previsão legal vem resguardada no art. 37 da Constituição da República:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

O respeito à lei editada pelo órgão competente enaltece o conceito de soberania popular consubstanciado no art.1º, parágrafo único, da Constituição Federal:

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
..............
Parágrafo único. Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

A interpretação combinada dos dispositivos legais acima transcritos ressalta a importância do papel da Câmara de Vereadores no desempenho do múnus administrativo municipal; inicialmente por ser esta casa a legítima representante do povo e, em seguida, por conter entre as suas funções a prerrogativa da disposição, através de lei, de todas as matérias da competência do município, especialmente quando se tratar da criação, novação, modificação e extinção de obrigações que impliquem alteração no patrimônio dos cofres públicos municipais.

Os legisladores municipais também não se eximiram em analisar tal questão, tanto que a Lei Orgânica estabelece como sendo da competência exclusiva da Câmara Municipal, dentre outros:

Art. 31. É da competência exclusiva da Câmara Municipal:
...................
IV – Resolver definitivamente sobre convênios, consórcios ou acordos que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio municipal.

A Câmara Municipal ao estabelecer, por intermédio da Emenda Aditiva nº 001/02, feita ao projeto de Lei nº 02 de 07/05/2002, que o Poder Executivo depende de prévia e individual aprovação ou referendo do Poder Legislativo para a celebração de contratos, convênios, termo de confissão de débito e/ou novação da dívida, termo de reconhecimento de débito, termo de aditamento com todas as secretarias e órgãos federais, estaduais e municipais, bem como empresas privadas que prestem serviços públicos, inclusive estabelecendo o bloqueio e recebimento, por esta, de valores relativos às contas do ICMS, até o limite das parcelas mensais do débito confessado junto à secretaria da Fazenda do Estado da Bahia ou Banco Bradesco, está tão somente exercendo fielmente suas atribuições legais, sem nenhum desrespeito à competência atribuída ao Poder Executivo.

Todos os itens elencados na emenda apresentam conteúdo gravoso ao patrimônio municipal, constituindo-se em atos que extravasam os poderes normais do administrador público e, por isso, necessitam para a sua validade da prévia aquiescência do legislativo.

Vejamos o que parágrafo único do art. 2º da Lei nº 8.666/93 considera como contrato:
Art. 2º. As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei.

Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se contrato todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontade para a formação.

O legislador pátrio determina no art. 116 da Lei nº 8.666/93 a aplicação de seus dispositivos aos convênios, acordos e demais instrumentos congêneres; vejamos:

Art. 116. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.

Percebemos a incidência da Lei de Licitações, norma federal, responsável pelo estabelecimento dos preceitos gerais pertinentes à matéria e que se encontra intimamente ligada ao princípio da legalidade, segundo o qual o administrador só pode fazer aquilo que a lei previamente autoriza.

Vejamos a lição do mestre Hely Lopes Meirelles:
“Qualquer ato que exceda a simples administração exige a expressa autorização da câmara. Nos poderes ordinários de administrar não se compreende o de gravar o patrimônio administrado. A administração tem por fim conservar e fazer reproduzir os bens confiados ao trato do administrador, daí a regra segundo a qual, o prefeito toda vez que tiver necessidade de dispor de bens ou de onerar o Município com encargos extraordinários, deverá obter autorização especial da câmara”.

Claro está que a inconstitucionalidade da referida emenda, toscamente alegada nas razões do veto, não passa de uma atitude do chefe do executivo municipal no afã de se eximir do devido procedimento legal. A intenção do Sr. Prefeito de concentrar em suas mãos um plexo maior de poderes, desconsiderando os princípios elementares disciplinadores da administração pública é que se apresenta como ato de ingerência e desrespeito às atribuições legais do Poder Legislativo.

Além dos argumentos já expostos, necessário se faz mencionar, a respeito do que talvez seja o próprio fôlego de vida que anima o ente estatal: o INTERESSE PÚBLICO. Os administradores jamais podem se distanciar deste, sob pena de subverterem a razão de ser do Estado, contribuindo para a quebra do pacto social previsto por Rousseau.

Ocorrendo hipótese em que fique patente a existência do interesse público, conjugado com o respeito à lei e com a observância dos demais princípios que regem a administração pública, será com grande presteza que a Edilidade concederá ao Sr. Prefeito a devida autorização para praticar os atos constantes da Emenda Aditiva nº 001/02.


2. Da Derrubada do Veto.

O veto aposto pelo Prefeito à Emenda Aditiva nº 001/02 feita ao Projeto de Lei nº 02/02, pode, com fundamento no § 4º, art. 43 da Lei Orgânica Municipal, ser derrubado pelo Poder Legislativo.
O referido dispositivo estabelece que o veto será apreciado pela câmara, em sessão única, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos vereadores em escrutínio secreto.


Conclusão

Demonstrada a consonância da Emenda Aditiva com a Constituição Federal e com a Lei nº 8.666/93, respaldando-se no princípio da legalidade e do interesse público que perpassam por toda a administração, bem como a falta de fundamentação das razões do veto, exatamente no que se refere à inconstitucionalidade da sobredita emenda, deve o Poder Legislativo proceder com a derrubada do mesmo, por ser medida de lídima justiça.

Sendo assim, longe de se constituir em ofensa à tripartição dos poderes, a derrubada do veto servirá para fortificar e harmonizar as relações entre os Poderes Executivo e Legislativo, uma vez que estará colocando em prática o sistema de freios e contrapesos, essencial aos países republicanos e democráticos.



É o parecer.
SMJ

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