domingo, 23 de fevereiro de 2014

NÃO EXISTEM REGRAS PARA VISITA AOS MENSALEIROS NA PAPUDA


Complexo Penitenciário. Rigor no acesso à Papuda não se aplica a deputados e senadores, apesar da proibição de visitas em dias e horários extraordinários
Foto: Givaldo Barbosa / Agência O Globo
Complexo Penitenciário. Rigor no acesso à Papuda não se aplica a deputados e senadores, apesar da proibição de visitas em dias e horários extraordinários Givaldo Barbosa / Agência O Globo
BRASÍLIA — Passados os três primeiros meses de cumprimento das penas dos réus do mensalão, uma prática que estressou o sistema prisional e revoltou parentes e presos ainda persiste. Parlamentares continuam entrando no complexo da Papuda em condições especiais, à revelia da decisão judicial que proibiu visitas diferenciadas ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e aos outros réus detidos nas unidades da Papuda. A romaria de deputados e senadores vista nos primeiros dias de prisão - diante da fila de parentes à espera de uma senha para a visita - já não é mais vista. Mas a regalia não teve fim.
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Em dezembro, os juízes da Vara de Execuções Penais (VEP) em Brasília determinaram o fim das visitas em dias e horários especiais, atendendo a um pedido do Ministério Público (MP) e da Defensoria Pública no DF. O GLOBO ouviu autoridades que atuam no sistema prisional para saber se parlamentares podem entrar nos presídios a qualquer momento, em razão do cargo que exercem. Todas as fontes confirmaram que deputados e senadores devem se enquadrar às regras definidas na decisão judicial.
Só existem três possibilidades para as visitas ocorrerem: o visitante estar cadastrado na relação de dez pessoas informada pelo preso e administrada pela Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe); mediante autorização judicial, em casos especiais; e em situações de inspeção nos presídios. Desde a decisão judicial em dezembro, a VEP e o MP não foram provocados para analisar a permissão de visitas especiais por deputados e senadores.
Pelo menos um deputado, o distrital Chico Vigilante (PT), confirmou que "pode adentrar a qualquer momento" na Papuda, por ser parlamentar. Ele contou ao GLOBO que esteve com Dirceu no Centro de Internamento e Reeducação (CIR), onde o ex-ministro está preso, há 15 dias. A próxima visita, segundo ele, será nesta semana.
- Eles continuam no mesmo estado, de indignação. Ainda se consideram injustiçados. Quis entrar na cela para ver. Se o preso não se sentir constrangido, pode receber visitas dentro da cela.
O parlamentar, que é líder do PT na Câmara Legislativa do DF, conta como costuma fazer as visitas:
- Eu visto uma roupa clara e vou.
Roupa branca é uma exigência para os detentos nas unidades da Papuda.
A prática do petista não é isolada. Servidores que atuam no sistema prisional relatam que parlamentares estão visitando a Papuda sem identificação. Há casos em que autoridades entram com coletes da Polícia Civil do DF, junto com a escolta policial ou dentro do carro de dirigentes do sistema.
O GLOBO tentou ouvir o subsecretário do Sistema Penitenciário, Cláudio Magalhães, e o coordenador-geral do sistema, João Feitosa, mas eles não atenderam às ligações. Os mesmos questionamentos foram feitos à assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública do DF, que se limitou a dizer que "Chico Vigilante não esteve no CPP neste ano". O CPP é o Centro de Progressão Penitenciária e está fora da Papuda. As visitas de Vigilante ocorreram no CIR, dentro do complexo, como ele mesmo relatou.
O MP e a Justiça têm dificuldades para controlar quem entra e quem sai da Papuda e das outras unidades prisionais. Autoridades só têm ciência quando são deferidas permissões especiais.
- Não temos controle sobre isso. É o presídio que tem. Se um deputado vai a hora que quer, é preciso antes fazer um pedido excepcional ao Ministério Público - diz uma autoridade que atua no sistema prisional.
Na Papuda, estão detidos seis réus do mensalão. Dirceu e os ex-deputados federais Valdemar Costa Neto (PR-SP) e João Paulo Cunha (PT-SP) dividem cela no CIR, onde cumprem pena em regime semiaberto. No fechado, em celas individuais da Penitenciária do Distrito Federal 2, estão o operador do mensalão, Marcos Valério, e seus ex-sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach. Outros três já obtiveram autorização para trabalhar fora e passam as noites no CPP: o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-deputado Bispo Rodrigues e o ex-tesoureiro do PL (hoje PR) Jacinto Lamas. O ex-deputado José Genoino (PT) cumpre temporariamente prisão domiciliar.
Dirceu cuida de livros
Dirceu obteve o direito de trabalhar no cuidado dos livros na biblioteca do CIR por ter sido considerado qualificado para a função. Nos horários do banho de sol, os presos podem frequentar a biblioteca. Para alguns, os livros são levados às celas. O horário de trabalho pode chegar a oito horas diárias. Na terça-feira, o ex-ministro presta depoimento à VEP sobre um suposto uso de celular no presídio. É esta suspeita que vem impedindo a autorização de trabalho externo na biblioteca de um escritório de advocacia. Tanto a Seção Psicossocial da VEP quanto o MP já manifestaram posição favorável.
Pedido de João Paulo em análise
Já o ex-deputado Valdemar Costa Neto está prestes a conseguir autorização para trabalhar fora. O despacho deve sair no início desta semana. Na véspera de Natal, ele recebeu um cartão pelos Correios do meio-irmão Frederico Costa. Os dois disputaram uma herança na Justiça e são desafetos. Frederico vive em Mogi das Cruzes (SP), base eleitoral de Valdemar.
- Mandei o cartão porque ele deve estar passando dificuldades, deve estar costurando bola. Ia mandar um panetone, mas talvez atrapalhasse - diz o irmão.
João Paulo Cunha, depois de renunciar ao mandato na Câmara, fez um novo pedido de trabalho, ainda em fase inicial de análise. Ele foi o último a chegar ao CIR, no dia 4. A cela que divide com Valdemar e Dirceu continua com água fria e infiltrações nas paredes.
Os presos que já obtiveram a autorização seguem a rotina de trabalho externo durante o dia. Delúbio, por exemplo, costuma receber colegas de partido na CUT, onde atua. Um deles é Chico Vigilante, que não precisa ir ao presídio para se encontrar com o ex-tesoureiro


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