quarta-feira, 25 de maio de 2016

A GOVERNABILIDADE DO PAÍS PIOROU APOS F.H.C.

Presidente interino Michel Temer da posse ao seu novo ministério em cerimónia no Palácio do Planalto (Foto: Diego Bresani/ÉPOCA)
"Decidi que vou nomear o (senador Iris) Rezende (ao Ministério da Justiça) e vou nomear o (deputado Eliseu) Padilha (ao Ministério dos Transportes). Assim vem o PMDB. Não posso só governar com pessoas próximas a mim. Tenho que fazer um pacto político. Um pacto político é sempre um pacto com o diabo, eu sei. Mas estou disposto a defender a necessidade de governabilidade.” O depoimento está em Diários da Presidência 1997-1998, segundo livro da série de memórias do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Quando fez esse registro, em maio de 1997, Fernando Henrique tinha 50% de aprovação da população, segundo uma pesquisa de opinião do Ibope. Ministro da Fazenda do governo Itamar Franco – o vice que assumiu a Presidência após o impeachment de Fernando Collor, em 1992 –, Fernando Henrique vencia a batalha contra a alta de preços. Com o Plano Real, a inflação caiu de 891% em 1994, ano da eleição presidencial, para 5,5%, em 1997. A emenda da reeleição passara na Câmara e, meses depois, passaria com facilidade no Senado. Mesmo em alta, Fernando Henrique sentiu-se premido a fazer um “pacto com o diabo”, para conseguir votos na Câmara dos Deputados – liderada, pela primeira vez, por um certo Michel Temer –, a fim de aprovar reformas necessárias à estabilidade econômica.
Duas décadas depois, a história se repete em parte. Desta vez,Michel Temer é o vice que assumiu a Presidência, em caráter provisório, conforme corre o processo de impeachment contraDilma Rousseff. O peemedebista Eliseu Padilha agora é ministro-chefe da Casa Civil, braço direito do presidente interino. Temer pertence ao PMDB, o maior partido da Câmara, como em 1997. Em tese, estaria menos propenso a fazer “pactos com o diabo”, como disse Fernando Henrique, para aprovar reformas necessárias para baixar a inflação e resolver a nova crise econômica. Mas os problemas políticos aumentaram nas últimas duas décadas.  “Nós vamos precisar muito da governabilidade”, disse Temer, em seu discurso de posse. Antes de assumir, ele falou em montar um ministério de “notáveis”. Acabou por lotear as Pastas entre nove partidos. 
Atualmente, as 513 cadeiras da Câmara dos Deputados estão distribuídas entre 25 partidos. As três maiores legendas (PMDB, PT e PSDB) concentram 34,9% dos votos. Na posse de Fernando Henrique, em janeiro de 1995, 15 partidos  estavam representados na Casa – e os três maiores detinham, juntos, 50,5% dos votos. A dispersão atual poderia parecer um saudável indício de que o Congresso se tornou mais plural, mais capaz de representar diferentes segmentos da sociedade. Infelizmente, trata-se de um engano. As minorias continuam mal representadas na Câmara – enquanto o sistema partidário passou por uma ultrafragmentação.
“Os parlamentares descobriram o seguinte: se eu tenho um partido, posso ter acesso ao fundo partidário e acesso ao tempo de televisão para negociar na campanha. Posso exigir um pedacinho do orçamento: um ministério, uma agência qualquer...”, diz Fernando Henrique, em entrevista a ÉPOCA. “Não são mais partidos. Com exceção de alguns poucos, são grupos de lobby. O lobby defende interesses. O partido defende valores.” A crise de representatividade que já existia no governo Fernando Henrique aumentou com o número de partidos. “O sistema político brasileiro está defasado dos anseios da sociedade”, diz o ex-presidente.
Para aprovar um projeto (por maioria simples) ou uma emenda constitucional (por maioria qualificada), o governo Temer precisa formar coalizões significativamente maiores, com grupos de interesses antagônicos e qualidade política menor. A dispersão do poder foi acompanhada da multiplicação de ministérios: eram 25 no primeiro governo Fernando Henrique e chegaram a 39, no segundo governo Dilma. Nem cabem no edifício da Esplanada. O governo Fernando Henrique tentou frear a criação de novos partidos, ao aprovar na Câmara a cláusula de barreira, mas o Supremo Tribunal Federal vetou. O governo Dilma, ao contrário, estimulou o surgimento de legendas como PSD e Pros, a fim de diluir sua dependência em relação ao PMDB. Deu um tiro n’água e fortaleceu o fenômeno Eduardo Cunha, afastado da presidência da Câmara por suspeita de corrupção. Em torno de Cunha, passou a orbitar a constelação partidária. Ele é o organizador do novo Centrão, um poderoso bloco formado por 13 partidos na Câmara – PP, PR, PSD, PRB, PSC, PTB, PSL, PEN, SD, PTN, PHS, Pros e PTdoB – e que reúne 220 deputados. Na semana passada, o Centrão impôs a Temer a indicação do deputado André Moura (PSC-SE), lugar-tenente de Cunha, como novo líder do governo na Câmara

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