domingo, 25 de setembro de 2016

O INIMIGO DA OPERAÇÃO LAVA JATO

Renan Calheiros (Foto: Adriano Machado/ Epoca)
Um dos mais generosos doadores de campanhas políticas na era pré-Lava Jato fazia troça de seus memoráveis encontros com o presidente do Senado, Renan Calheiros, na tarde da segunda-feira (19). “Renan é um caos. Custo a acreditar que ele seja esse articulador frio e calculista que dizem”, afirmou o empresário, ex-habitué do gabinete do senador e de reuniões menos formais, como almoços e jantares. O industrial diz que as conversas com Renan eram sempre leves e não davam brecha ao falatório político. “Quando ele me ligava para convidar para um encontro no gabinete, me sentia importante. Mas, ao chegar, havia outros 30 convidados na mesma situação: ao redor daquela mesa de café da manhã abarrotada de gente, com pedaços de pão por todo lado.” Como é de costume entre os políticos, nas entrelinhas Renan sinalizava que o ajudaria em seus interesses. Na prática, entretanto, pouco fazia para beneficiá-lo diretamente. A conta da “amizade” chegava ao industrial na sequência. Intermediadores do senador apareciam para recolher as doações de campanha que o empresário se esquiva de dizer se eram “caixa dois”.
Na mesma tarde da segunda-feira em que era lembrado como “caótico” pelo empresário, Renan costurava mais uma de suas artimanhas no Congresso. Com o consentimento de lideranças partidárias e de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, Renan articulou um penduricalho ao projeto legislativo das 10 Medidas contra a Corrupção. Já em plenário, os deputados enxertaram, num texto que é mantido em sigilo até agora, uma emenda que viabilizava o perdão da prática de caixa dois. Valeram-se do princípio de que a lei não retroage para prejudicar o réu. A proposta foi concebida por lideranças do PSDB e do PP, com parlamentares enrolados na Lava Jato, e colocada em prática com a anuência de líderes políticos. Na Câmara, a medida teve o aval de Rodrigo Maia, que na ocasião estava como presidente em exercício em decorrência da viagem de Michel Temer a Nova York. No Palácio do Planalto, do secretário de Governo, Geddel Vieira Lima – mais tarde, ele chegou a afirmar que caixa dois não é crime em entrevista ao jornal O Globo. Se fosse aprovada, a medida inibiria a Lava Jato de tratar o recebimento de dinheiro fora da contabilidade eleitoral como corrupção.  Segundo as investigações da operação, muitos políticos e partidos usaram do artifício para receber propina.
Embora não tenha sido o mentor original, Renan teve participação substancial na estratégia. Ao ouvir de lideranças que a Câmara não apresentaria o enxerto sem a intenção do Senado em votá-lo imediatamente, Renan se comprometeu a ajudar. Sinalizou que cancelaria uma sessão do Congresso, marcada para a mesma segunda-feira, para não paralisar os trabalhos em discussão na Câmara. Fez mais. Indicou que colocaria a anistia em votação no Senado já no dia seguinte. Se transcorresse como o previsto pelos deputados, a jogada passaria despercebida pelo crivo da opinião pública até chegar ao Senado. Com o acordo já costurado, a emenda poderia ser rapidamente aprovada

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